segunda-feira, 24 de novembro de 2014

O STF ABSOLVE O “CAIXA DOIS”

Por Trajano Jardim*
Com a conclusão da Ação Penal 470, o Supremo Tribunal Federal, na maioria dos casos, atropelou normas jurídicas internacionais. Não chega a ser novidade. Ao longo da história, o STF cometeu muitas violações para satisfazer os interesses dos senhores da “casa grande” contra a maioria da “senzala”.

Uma das mais significativas castrações de direitos, coletivos e individuais, ocorreu em 1946, quando a corte cassou o mandato dos constituintes eleitos pelo Partido Comunista Brasileiro. Dentre eles, o senador Luís Carlos Prestes.

Outra violação de direitos perpetrada pelo STF foi em 1964. O Supremo, representado pelo seu presidente à época, chancelou a posse de Ranieri Mazzilli na trágica noite do golpe militar, quando o presidente João Goulart ainda se encontrava em território nacional. Assim, a suprema corte, que tinha sob sua responsabilidade defender a Carta Magna, ainda vigente, fazia-se avalista de sua ruptura.

Vários dos eminentes ministros do STF, no curso do julgamento da Ação Penal 470, que a grande mídia (em revanche contra as derrotas eleitorais sofridas nos últimos 12 anos), achou por bem chamar de “mensalão”, têm declarado que “este é o maior escândalo de corrupção havido no Brasil”. Para alguns deles, chegou a abalar a República.

RECORDAR É VIVER

Parece certo quando se diz que o Brasil é um país sem memória. Pelo visto os supremos juízes da nossa suprema corte, também as têm. Em 1997, surgiram gravações de escutas telefônicas com fortes evidências de que havia um esquema para compra de votos de deputados arregimentados por Sérgio Motta, o Serjão, então ministro das Comunicações.

A Folha de S.Paulo, apesar de defensora do governo do PSDB, foi o primeiro veículo a apontar o escândalo. E na sequência de reportagens, o jornal criou um “selo” com a frase: “Reeleição comprada?” para ilustrar o assunto. Faziam parte do esquema, os governadores Orleir Cameli (AC) e Amazonino Mendes (AM) e dois deputados, João Maia, egresso do PT e Ronivon Santiago, ambos do PFL, integravam o projeto.

Na  edição de maio de 1997, a Folha de S. Paulo,  publicou extensa matéria com transcrição da gravação de uma conversa na qual os Deputados Ronivon Santiago e João Maia, ambos do PFL do Acre, confessavam ao repórter Fernando Rodrigues, ter recebido R$ 200 mil para votar a favor da emenda constitucional que instituía a reeleição para presidente da República, governadores e prefeitos. Naquele momento a emenda já havia sido aprovada na Câmara dos Deputados e aguardava a votação no Senado.

Assim, podemos concluir que os votos proferidos pelos ministros do STF na Ação 470, ou são peças de retórica para satisfazer a imprensa julgadora, ou eles não conhecem a história política do Brasil. O que não parece ser o caso.

A CULTURA DA CORRUPÇÃO NO BRASIL

Apesar do liberalismo defendido pelas elites brasileiras, o Estado sempre interveio para proteger o setor exportador, principalmente os cafeicultores, os socorrendo com recursos públicos, quando o valor das exportações se desvalorizava. Na República Velha, dois estados tiveram a liderança política: São Paulo e Minas Gerais.

Em 1891, é promulgada a primeira Constituição republicana, inspirada na Constituição norte-americana. Nela se estabelecia o federalismo e o presidencialismo como princípios norteadores do regime republicano. Esse período foi dirigido principalmente pelas oligarquias paulista e mineira, ligadas ao  setor agroexportador, representado pelos cafeicultores paulistas que constituía o setor mais dinâmico da economia brasileira.

Transportando o problema da corrupção à nossa época podemos lembrar, em poucas palavras, o que dizia o ministro Romildo de Souza, corregedor geral do TSE, sobre o processo eleitoral de 1989/1990 “O modo como o abuso econômico pode afetar a moralidade do processo eleitoral sofistica-se a cada dia. No passado este abuso acontecia no varejo: os candidatos e seus amigos procuravam, de forma individualizada, influir no processo”.

Para o corregedor Romildo, nas campanhas mais recentes a forma de corrupção do poder econômico e de comprometimento do processo eleitoral, é menor em face de outras formas mais sofisticadas, como o emprego da televisão e meios rápidos de transportes, movimentam grandes somas que corrompem a lisura do processo.

A banalização do uso do caixa 2 como forma de burlar o grande número de impostos e taxas aos quais os brasileiros são submetidos, faz dessa prática um hábito incrustrado na sociedade em todos os seus seguimentos. É reconhecido que o cenário político é o extrato social do país em que essa prática aparece com mais força.

A cada campanha política os escândalos se sucedem envolvendo políticos. As chamadas “doações” de empresários para candidatos e organizações partidárias, não são inocentes, são na verdade subornos, para beneficiar candidatos com potencial eleitoral. É a partir desse fenômeno que se inicia as relações escusas que, de há muito, é do conhecimento do judiciário, conforme constatação do ministro Romildo de Souza.

Em uma decisão política, onde prevaleceu à pressão midiática, o STF preteriu o processo da Ação Penal 536, que envolve políticos do PSDB, cujo relator, coincidentemente, é o ministro Joaquim Barbosa, e optou por julgar o processo relativo à base do governo Lula. A partir desta opção e pela tese defendida abertamente pelo relator de "flexibilização de provas", pode-se dizer que a opção do STF foi de não enfrentar de frente o problema do “caixa dois”.

A condenação da política do Caixa 2, pelo STF,  levaria a corte a, forçosamente, propor a reforma política, com a instituição do financiamento público de campanha, que tem sido defendido, de há muito, pelas forças progressistas, para inibir a corrupção,  os favores eleitorais e as “vendas” por altas quantias do “tempo de televisão”.

Parece que as pressões midiáticas e das elites dominantes, levaram os nossos ministros do STF a optar pela luta de egos entre eles a dar fim ao lodaçal da política brasileira que envolve os partidos e políticos de “cabo a rabo”.  Muito mais cômodo se voltar para os holofotes da mídia e  encaminhar a acusação em sentido contrário a tese da defesa dos réus e absolver a prática que envolve todo o parlamento.

Assim, por obra e graça do STF, a praga do “caixa 2” vai continuar serelepe pulando num pé só feito saci-pereré gozando da cara do leitor. Enquanto isso, a tese do “domínio do fato” do senhor Barbosa vai alimentando as ânsias golpistas da “casa-grande” contra a presidente Dilma.

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Jornalista Profissional/Professor Universitário


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